ANTICANDIDATURA AO STF - SORAIA MENDES

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21 de julho de 2021
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A importância deste abaixo-assinado

Iniciado por STF LAICO E INDEPENDENTE

POR QUE SOU ANTICANDIDATA AO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL?
Não há melhor sentimento para qualquer jurista que se atreva a oferecer seu
nome, história e trajetória profissional para ocupação de uma cadeira na mais Alta Corte
de seu país do que poder dizer que não é candidata de si mesma. E, para minha honra,
se me for feita a pergunta que está no título desta carta, poderei responder: SOU
candidata a uma vaga no Supremo Tribunal Federal porque não sou candidata de mim
mesma.
Represento centenas e centenas de magistradas e magistrados, de defensoras
e defensores públicos, de advogadas e advogados públicos e privados, de integrantes
do Ministério Público, enfim, de profissionais das mais diversas carreiras jurídicas, além
de estudantes e de acadêmicos e acadêmicas que comigo comungam a certeza de que
o respeito ao papel que a Corte desempenha em uma ordem jurídica democrática deve
ser a única força motriz de uma indicação deste porte.
Sou mulher, mãe, negra. Nasci e cresci em uma “vila”, como no Rio Grande do
Sul é chamada a “periferia”. Filha de um operário de fábrica sindicalista fundador da
Central Única dos Trabalhadores, sobrinha-neta de um velho ferroviário, também
sindicalista, que amargou o cárcere desde as primeiras horas do golpe de 1964 em razão
do que pregava em um certo programa de rádio chamado “Ronda das Classes”. Trago,
portanto, nas veias, na vivência e na consciência o significado das desigualdades de
gênero, raça e classe que estruturam uma sociedade que ainda almeja realizar o sonho
constitucional de ser de fato livre, justa e solidária.
Se me for dado a responder mais uma vez a mesma pergunta, diria: não sou
candidata de mim mesma. Represento milhões que compõem a base da pirâmide social,
racial e econômica deste país. Cria de uma geração que nasceu sob o arbítrio, mas que
chegou à adolescência deslumbrada com uma Assembleia Nacional Constituinte que nos
entregou a certidão de nascimento para um novo tempo pelo qual ainda esperamos.
Sou uma intelectual dedicada às Ciências Criminais sob uma perspectiva crítica
feminista. Meus livros, artigos científicos e capítulos são citados pelos tribunais deste
país, inclusive no próprio Supremo Tribunal Federal. Meus trabalhos são publicados e
referidos em renomadas instituições do Chile, da Austrália, da Colômbia, de Portugal,
da Argentina e da Itália. E é citando isso tudo que marco a universidade pública como o
lugar donde emergiu toda minha produção científica.
Sou mestra em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul
(UFRGS), doutora em Direito, Estado e Constituição pela Universidade de Brasília (UnB),
pós-doutora em Teorias Jurídicas Contemporâneas pela Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ). Na universidade pública fui professora substituta, professora efetiva,
professora visitante. Fui, e sigo sendo, uma pesquisadora.
Se, por uma terceira vez, me dessem a oportunidade de responder à questão
do título, replicaria sem pestanejar: não sou candidata de mim mesma. Sou um dos
muitos frutos da universidade pública, onde aprendi a fazer ciência e, fazendo ciência,
solidifiquei a convicção de que a experiência republicana não admite que Estado, Direito
e religião se misturem. O Estado é laico, assim “reza” nossa Constituição.

Sou advogada. Há mais de vinte anos faço de minha profissão uma trincheira
de defesa dos direitos humanos das mulheres, de quilombolas, de servidoras e
servidores públicos, de indígenas, de rádios comunitárias, de pessoas LGBTQIA+. Sou
uma das signatárias da Arguição de Descumprimento de Fundamental n. 779, pela qual,
de modo inédito, por unanimidade, foi deferida liminar para afastar a inaceitável tese
da “legítima defesa da honra” nos casos de feminicídio.
Como expert em Processo Penal nomeada pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos emiti parecer para os fins de balizar a decisão a ser proferida por
aquele órgão internacional no Caso 12.263 em que se discute a responsabilidade do
Estado Brasileiro na investigação, persecução penal e julgamento da morte da jovem
Marcia Barbosa, na Paraíba dos anos noventa. E, por dois mandatos consecutivos, fui
coordenadora nacional do Comitê Latino-Americano e do Caribe para a Defesa dos
Direitos das Mulheres – CLADEM, organização de juristas feministas que levou o caso
Maria da Penha ao Sistema Interamericano de Direitos Humanos donde adveio a
recomendação da qual resultou a edição de uma lei com nome de mulher.
Enfim, se pela quarta e última vez me fosse perguntado por que sou candidata
a um lugar dentre os onze ministros e ministras de nossa Corte Maior, falaria: não sou
candidata de mim mesma. Sou uma das tantas atrizes do sistema de justiça consciente
de que o princípio da dignidade humana, elevado a fundamento do Estado Democrático
de Direito brasileiro, ainda é uma promessa quando se trata da vida de todas nós
mulheres, cis, trans, lésbicas, indígenas, negras.
Em síntese, diante de tudo disso, se me perguntarem por que sou candidata a
ocupar uma vaga no Supremo Tribunal Federal, rapidamente responderei: porque não
sou “uma” candidata, sou parte de um coletivo que tem a mais absoluta convicção de
que a Constituição não é só um pedaço de papel, de que a ordem democrática precisa
ser respeitada, de que o Supremo não pode ser apequenado com indicações que
venham da bebida que se ingere no final de semana ou de uma quebra grosseira da
laicidade do Estado pela incitação da intolerância religiosa entre brasileiros e brasileiras.
Por que sou candidata a uma vaga no STF? Simples, porque não sou candidata,
sou uma anticandidata. É para isso que meu nome, minha história e minha trajetória
profissional servem, para honrar a cadeira que hoje se encontra vazia na Corte.
Brasília, 20 de julho do (ainda) pandêmico ano de 2021.
Soraia Mendes

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